24 janeiro 2009

Novas perspectivas nos Estados Unidos

Artigo de Wanderley de Souza

“Dados indicam claramente que a ciência americana passará por uma fase de crescimento significativo nos próximos anos”

Wanderley de Souza é ex-secretário estadual de Ciência e Tecnologia do RJ e diretor de programas do Inmetro. Artigo publicado no “Jornal do Brasil”:

É amplamente conhecido que a atividade científica e tecnológica tem nos Estados Unidos da América do Norte a sua base principal. Afinal, por muitos anos, este país é líder inconteste no número de artigos publicados em revistas internacionais indexadas, contribuindo com cerca de 350 mil publicações em revistas de circulação internacional.

Como comparação, a segunda e a terceira posições são ocupadas pela China e pelo Reino Unido, que publicaram, respectivamente, cerca de 180 mil e 110 mil artigos. Esta invejável posição dos EUA, que permitiu ao país conquistar a liderança em quase todas as áreas do conhecimento, é conseqüência de uma política de investimentos na atividade científica, inicialmente surgida no ambiente universitário. No entanto, logo se espalhou para instituições tecnológicas e centros de pesquisa e desenvolvimento de empresas.

Para que tudo isto ocorresse, recursos significativos vêm sendo investidos por órgãos americanos como o Instituto Nacional de Saúde (NHI), a Fundação Nacional de Ciência (NSF), os departamentos de Energia, Agricultura, Defesa, etc. Por outro lado, um número crescente de fundações privadas, entre as quais destaca-se no momento a Fundação Melinda e Bill Gates, oferecem apoio importante a projetos relevantes em várias áreas do conhecimento.

O que há de novo no cenário da ciência norte-americana? Primeiro, o presidente eleito Barack Obama anunciou que os Estados Unidos irão dobrar, em um período de 10 anos, os investimentos em ciência e tecnologia, visando a consolidar sua posição de liderança nesta área, considerada por todos como fator predominante do desenvolvimento econômico.

Tais investimentos serão realizados por vários órgãos do governo, sobretudo o NIH, a NSF e o Departamento de Energia. Para assegurar tal intenção, o presidente eleito organizou uma equipe de craques. Para comandar o Departamento de Energia irá o professor Steven Chou, eminente físico, que deu contribuições importantes ao estudo da colisão de laser e que ocupou posições importantes no Bell Labs e na Universidade de Stanford.

Há cerca de um ano, fiz parte de uma delegação governamental para estabelecer cooperação na área de bioenergia. Lá, tive a oportunidade de visitar o conhecido Lawrence Berkeley National Laboratory, onde Steven Chou também lidera um grupo de pesquisas na área de bioenergia, priorizando o estudo de alternativas no aproveitamento da biomassa. Baseado nas reuniões que tivemos com toda a sua equipe, certamente a identificação de novas fontes de energia renovável será uma prioridade da sua atuação.

Cabe ainda lembrar que, por seus importantes trabalhos, Steven recebeu, em 1997, o Prêmio Nobel de Física. Para a assessoria direta da área de ciência e tecnologia, Obama convidou outros três grandes nomes da ciência americana contemporânea, como John Holder, presidente da Associação Americana para o Progresso da Ciência, equivalente à nossa SBPC. Este pesquisador, que é um importante dirigente de um centro de pesquisas na área das ciências ambientais e das mudanças climáticas globais na Universidade de Harvard, assumirá a coordenação da assessoria de Ciência e Tecnologia, posição com status de ministro.

Junto a John Holder, o presidente contará ainda com a colaboração de dois líderes da ciência biomédica americana. O primeiro é Harold Varmus, atual presidente do Memorial Sloan Kettering Cancer Center de New York, certamente um dos mais importantes centros de pesquisa na área da oncologia. Harold foi ainda presidente do NIH no período de 1993 a 1999 – durante a gestão de Bill Clinton – ocasião em que dobrou o orçamento do NIH. Seus trabalhos com retrovirus, realizados na Universidade da Califórnia, em São Francisco, o levaram ao Prêmio Nobel, que recebeu em 1989.

Harold tem sido um grande incentivador da ciência nos países em desenvolvimento. Durante uma de suas visitas ao Brasil, o levei para um encontro com a governadora Rosinha Garotinho, ocasião em que, com seus argumentos, contribuiu para que a Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa (Faperj) alcançasse a posição de relevo que hoje ocupa no apoio à pesquisa científica no estado do Rio de Janeiro.

Outro assessor do novo presidente americano será Eric Lander, professor de biologia do famoso MIT e um dos líderes do projeto Genoma Humano, de grande repercussão mundial.

Todos estes dados indicam claramente que a ciência americana passará por uma fase de crescimento significativo nos próximos anos. Os primeiros comentários indicam que a nova equipe deverá utilizar a conhecida estratégia que teve êxito no passado, de recrutar bons pesquisadores em todo o mundo, oferecendo excelentes condições de trabalho.
(Jornal do Brasil, 22/1)

Fonte: JC e-mail 3687, de 23 de Janeiro de 2009.

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Com Obama, ciência 'em seu devido lugar'

Cientistas esperam que o governo derrube restrições à pesquisa

Quando o presidente Barack Obama jurou em sua posse “recolocar a ciência em seu devido lugar”, estava sinalizando o fim de oito anos de tensão entre pesquisadores e o governo. Porém, muitas das restrições impostas por Bush à ciência, como o controle das pesquisas com células-tronco, ainda devem levar tempo para serem removidas.

E mesmo que Obama elimine totalmente o rigoroso controle na ciência, alguns resquícios permanecerão. Ainda assim, muitos cientistas estão exultantes. Funcionários de agências científicas tinham os olhos marejados de alegria nas festas em comemoração ao novo governo.

— Se você olhar para a ciência no mundo, verá vários rostos felizes — disse Frank Press, ex-presidente da Academia Nacional de Ciências e ex-conselheiro para ciência no governo do presidente Jimmy Carter. — Não se trata de ganhar dinheiro. É o reconhecimento do que ciência pode fazer para recuperar este país e de forma inovadora.

Em temas como células-tronco, mudanças climáticas, educação sexual e contraceptivos, Bush controlou e, em alguns casos, suprimiu dados de agências científicas. E desencorajou pronunciamentos científicos que contrariavam a política de governo.

No início de 2004, um grupo de mais de 60 cientistas influentes, incluindo 20 laureados com o Prêmio Nobel, emitiu declaração afirmando que o governo Bush tinha distorcido sistematicamente dados científicos a serviço de objetivos políticos, em temas relacionados a meio ambiente, saúde, à investigação biomédica e a armas nucleares.

Anúncio sobre célula-tronco na próxima semana

Durante a administração Bush, por exemplo, os funcionários do FDA (órgão que regula drogas e alimentos nos EUA) estavam proibidos de emitir informes de imprensa sem a autorização de supervisores do Departamento de Saúde e Serviço Humano.

Estas são algumas das feridas na integridade científica que o presidente Obama prometeu cicatrizar. O bálsamo mais rápido foi a mudança de tom na sua fala à nação: “Vamos construir estradas e pontes, redes elétricas e linhas digitais que alimentam o nosso comércio e nos unem. Vamos recolocar a ciência no seu devido lugar, e usar, com eficácia, as maravilhas tecnológicas para melhorar a saúde e diminuir os seus custos. Vamos aproveitar o Sol, os ventos e o solo para produzir combustível para abastecer nossos carros e mover nossas fábricas.” Isto levará mais tempo para acontecer do que a administração Obama tem prometido.

Na próxima semana o presidente deverá anunciar o fim das restrições às pesquisas com células-tronco embrionárias humanas. Mas até que as novas regras sejam escritas e formalizadas, laboratórios terão o seu trabalho limitado. (Gardiner Harris e William Broad, do New York Times)
(O Globo, 23/1)

Fonte: JC e-mail 3687, de 23 de Janeiro de 2009.

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23 janeiro 2009

Por uma expansão global do saber

Artigo de José Monserrat Filho

“Ligar a ciência ao homem comum e o homem comum à ciência. É o caminho que estamos obrigados a percorrer se quisermos crescer na nossa inteligência e humanidade”

José Monserrat Filho é chefe da Assessoria de Assuntos Internacionais do Ministério de Ciência e Tecnologia. Artigo enviado pelo autor ao “JC e-mail”:

O velho continente, berço da ciência no Ocidente, parece feliz com suas novas perspectivas na busca do conhecimento – mais necessária que nunca, neste século 21 pleno de desafios globais.

A União Européia (UE) vem de publicar os resultados animadores de ampla consulta sobre a percepção pública da ciência e a visão da cidadania diante da política européia na área de pesquisa científica. O levantamento, realizado ao longo de 2008 nos 27 países-membros da UE, ouviu homens e mulheres de diferentes camadas sociais com idade entre 17 e 60 anos.

Para Janez Patocnik, da Comissão Européia para Ciência e Pesquisa, “os resultados são particularmente encorajadores, pois provam que a população não é indiferente às ciências e que o objetivo da Comissão de construir o Espaço Europeu da Pesquisa caminha em boa direção”. A seu ver, “os cidadãos consideram a ciência como um instrumento de progresso e são favoráveis a uma estratégia européia mais concreta no âmbito das ciências e das tecnologias”.

As esperanças e os temores das pessoas, segundo o estudo, concentram-se sobretudo nas questões percebidas como tendo incidência direta e concreta na vida diária. Os consultados se manifestaram sobre temas científicos potencialmente polêmicos e controversos, como as experiências com animais, as células-tronco e os biocombustíveis.

Eles, em geral, reagiram de modo positivo aos avanços alcançados nas áreas médicas e farmacêuticas, à procura de solução para os problemas energéticos, ambientais e climáticos, bem como à criação, inovação e aperfeiçoamento de produtos capazes de facilitar as tarefas cotidianas.

Apareceram, também, preocupações sérias sobre os riscos das manipulações genéticas, dos organismos geneticamente modificados (OGM), as ameaças à saúde, as mudanças climáticas e o uso da ciência e da tecnologia com propósitos destrutivos, como as armas de destruição em massa, especialmente as nucleares e químicas.

Mas os cidadãos da UE, especialmente do sul e do leste europeu, não deixaram de frisar que acham fraca e insuficiente a pesquisa científica em seus países.

Eles atribuem esse quadro negativo aos baixos orçamentos para a pesquisa, à ausência de visão e de vontade política, à deficiente organização da pesquisa pública e ao reduzido interesse pelas carreiras de pesquisador como efeito das condições de trabalho oferecidas aos pesquisadores nos países europeus, o que tem levado à fuga de cérebros.

Se isso acontece na Europa, imagine no chamado mundo em desenvolvimento. Daí que a questão, na verdade, é global, e não pode ser enfrentada na base do cada um por si, como tem sido.

Claro que as opiniões expressas na pesquisa da UE sobre as condições da C&T nos três grandes países europeus – Alemanha, França e Reino-Unido – são mais positivas.

Apesar das diferenças regionais, o balanço final é de que os europeus estão realmente convencidos de que o desenvolvimento da pesquisa é vital para seus países. E apóiam a idéia de que “conviria fazer mais”.

Evidencia-se o consenso quase unânime em favor de uma ação européia pela pesquisa científica e seu fortalecimento. O princípio da cooperação no setor é igualmente visto com simpatia por estimular e facilitar o intercâmbio e o enriquecimento mútuo de idéias e experiências.

Para os organizadores da consulta, o que está em questão, explícita ou implicitamente, é a capacidade européia de inventar e inovar em relação a seus grandes concorrentes internacionais, como os EUA e o Japão.

Cabe lembrar a propósito o que o Brasil e a UE inscreveram no Plano de Ação Conjunta de Parceria Estratégica para os próximos três anos, aprovado pelos presidentes do Brasil e da França, Luiz Inácio Lula da Silva e Nicolas Sarcozy, este como presidente do Conselho da UE, e pelo presidente da Comissão Européia, Durão Barroso, na II Reunião de Cúpula realizada no Rio de Janeiro, em 22 de dezembro último:

“A União Européia e o Brasil compartem a convicção de que uma ciência forte e uma sociedade baseada no conhecimento são o melhor pré-requisito para o desenvolvimento sócio-econômico equitativo e sustentável.”

No tocante à Promoção da Ciência, Tecnologia e Informação, reiterou-se a necessidade de “ampliar a eficácia do diálogo sobre ciência e tecnologia, com o aperfeiçoamento dos mecanismos de coordenação e difusão de informações”, como consta nas diretrizes do Acordo de Cooperação Científica e Tecnológica firmado entre o Brasil e a UE em 2006.

E quanto à cooperação em prol da Sociedade da Informação, frisou-se que “as tecnologias da informação e comunicação (TICs) exercem papel fundamental na promoção da inclusão digital e no aumento da coesão social, melhorando a qualidade de vida e reduzindo a pobreza”.

Teria sido, certamente, da maior relevância introduzir um item especial sobre a cooperação no campo da percepção pública da ciência, parte essencial de qualquer esforço de popularização da ciência, que hoje tanto o Brasil quanto a UE se empenham em promover. Até porque este tema já integra, por exemplo, o Plano de Ação em CT&I firmado entre o Brasil e a Espanha em 2008.

Em 2009, teremos o Ano da França no Brasil e o Ano da Cooperação Brasil-Alemanha, que festeja os 40 anos do nosso primeiro acordo binacional em C&T. Em ambos os casos, haverá intensa e variada programação em áreas fundamentais do conhecimento.

Teremos, também, o Ano Internacional da Astronomia, que busca, entre outras metas, “difundir na sociedade uma mentalidade científica”, e que dará ao Brasil o privilégio de reunir no Rio de Janeiro, de 3 a 14 de agosto, a 27ª Assembléia Geral da União Astronômica Internacional; o Ano de Darwin, comemorando os 200 anos do nascimento de Charles Darwin e os 150 anos de sua obra maestra “A Origem das Espécies”, que revolucionou a ciência da vida; os 60 anos do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), que mudou a história da ciência em nosso país e que hoje desenvolve, em ritmo crescente, importantes programas de cooperação internacional.

São oportunidades imperdíveis para despertar no grande público a curiosidade, o fascínio e o interesse pela ciência e tecnologia.

Neste contexto, nunca é demais insistir na dramática especificidade do nosso tempo.

Sérgio Paulo Rouanet, filósofo e ex-diplomata, em seu belo texto “Por um saber sem fronteiras”, publicado no livro “Mutações – Ensaios sobre as novas configurações do mundo” (edição Agir/SescSp, 2008, org. por Adauto Novaes), vê pela frente uma mutação que se impõe.

Clama ele: “É preciso que haja uma inflexão, a passagem para uma etapa em que o homem volte a ser sujeito do processo de geração e aplicação do conhecimento. A mutação que pretendemos deverá devolver ao homem a capacidade de ter uma visão de conjunto das atividades técnico-científicas, sem o que a democracia seria substituída pela logocracia”, por um poder do saber capaz de se tornar totalitário.

Rouanet alerta: “A própria sobrevivência da democracia depende da capacidade dos cidadãos de reassumir algum controle sobre os rumos da ciência, pois de outro modo haveria o risco de que uma ciência cada vez mais esotérica e menos inteligível para o homem comum, cada vez mais comprometida com o complexo industrial-militar, cada vez menos sensível aos riscos ecológicos que pesam sobre o planeta, usurpasse o poder decisório que numa sociedade democrática só pode ser exercida pelo povo soberano”.

Ligar a ciência ao homem comum e o homem comum à ciência. É o caminho que estamos obrigados a percorrer se quisermos crescer na nossa inteligência e humanidade. E não só na Europa e no Brasil. No mundo inteiro. Cada país, cada povo, do seu jeito. Mas globalmente.

Seremos todos cidadãos do planeta Terra. Ou como sobreviveremos amanhã ou depois?

Fonte: JC e-mail 3686, de 22 de Janeiro de 2009.

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19 janeiro 2009

Falsa neutralidade

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – A ciência e a tecnologia estão longe de ser politicamente neutras e as novas descobertas não correspondem necessariamente a progressos para a sociedade, segundo o professor Fernando Tula Molina, da Universidade de Quilmes, na Argentina. Para ele, embora façam parte do senso comum, as noções de neutralidade científica e determinismo tecnológico representam obstáculo para uma ciência democrática, capaz de melhorar a sociedade.

Ideias como essas foram expostas por Molina em nove sessões entre agosto e dezembro de 2008, durante o 15º Seminário Internacional de Filosofia e História da Ciência, realizado pelo Grupo de Filosofia, História e Sociologia da Ciência e da Tecnologia do Instituto de Estudos Avançados (IEA), da Universidade de São Paulo (USP).

O seminário foi um produto do Projeto Temático Gênese e significado da tecnociência: relações entre ciência, tecnologia e sociedade, Universidade de São Paulo, apoiado pela FAPESP e coordenado por Pablo Rubén Mariconda, do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.

Doutor em filosofia pela Universidade de Buenos Aires, Molina permaneceu no Brasil como professor convidado do projeto. No evento, discutiu o tema “Controle, rumo e legitimidade das práticas científicas".

Para avaliar as implicações científicas e sociais das práticas tecnológicas, o professor propõe uma distinção entre a “eficácia” e a “legitimidade” dessas práticas – e busca elementos conceituais para a compreensão das origens culturais dessa distinção e da complexidade dos diferentes atores envolvidos.

Segundo Molina, que também é pesquisador adjunto do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas (Conicet), na Argentina, “essa compreensão contribuirá para que se encontrem os caminhos que levem ao acordo requerido pelas políticas científicas nos espaços de diálogo das instituições democráticas”.

Agência FAPESP – Uma das idéias centrais desenvolvidas pelo senhor durante o seminário realizado no mês passado em São Paulo é a de que a ciência não pode ser dissociada da política. Como essa questão foi tratada nos debates?
Fernando Tula Molina – As discussões tiveram origem em um Projeto Temático apoiado pela FAPESP dirigido pelo professor Pablo Mariconda, do Grupo de Filosofia, História e Sociologia da Ciência e da Tecnologia do IEA, responsável pelo seminário. Esse projeto discute a gênese e os significados da tecnociência. Isso envolve questões históricas, filosóficas e sociológicas, mas no fundo tudo está virando uma área importante ligada à política. Tentamos problematizar duas idéias que hoje são muito fortes em nossa cultura: a neutralidade da ciência e o determinismo tecnológico. Essas duas noções estabelecem no imaginário popular uma idéia de que a ciência é neutra, desprovida de política, quando, na verdade, a ciência – e sobretudo a tecnologia – tem muita política.

Agência FAPESP – Como esse aspecto político se manifesta?
Molina – Uma das linhas que está sendo desenvolvida é que essa política pode ser vista com clareza, por exemplo, no chamado código técnico. Esse gravador digital que você está utilizando, por exemplo, possui um design que encerra em si todo o contexto de sua concepção e está ligado a determinadas estratégias. Essas estratégias representam interesses – que, no caso de uma sociedade capitalista, correspondem aos interesses das corporações. São interesses que têm a ver com o consumismo tecnológico. O projeto do gravador já prevê quando ele sairá de linha, isto é, carrega consigo uma estratégia de obsolescência programada. Para que você consuma mais, é preciso que na sua cabeça a aquisição de novos produtos tecnológicos seja entendida como um progresso. Você acredita que está progredindo e tem um aparelho melhor, de última tecnologia. Mas eventualmente os aparelhos mais antigos tinham mais qualidade. Isso é pura política.

Agência FAPESP – Essa é a idéia do determinismo tecnológico? Uma crença de que o produto que acaba de ser lançado é necessariamente melhor, mais eficiente e mais desejável?
Molina – Sim. É uma estratégia de consumo que se baseia na novidade. O produto é um bem cultural que se vale do valor simbólico que tem a “eficácia” na nossa cultura, levando a pessoa a pensar que os produtos desenvolvidos mais recentemente são melhores. Mas isso é uma falácia. Outra falácia está no discurso político oficial dos nossos países: a idéia de que o cientista pode dizer o que é melhor para a sociedade. O cientista não sabe o que é melhor para a sociedade. Não existem nem mesmo elementos conceituais para abordar essa questão. O seminário teve, portanto, a tarefa central de instalar uma discussão e conscientizar sobre alguns erros. Muitos desses erros, como o individualismo, têm origem filosófica.

Agência FAPESP – Como o individualismo é tratado nessa discussão?
Molina – Quando a lógica predominante é a de que alguém só consegue ganhar quando os demais perdem, o resultado é que as pessoas passam a achar que podem ser livres apenas de portas fechadas. O que gostaríamos de opor a essa idéia individualista é a possibilidade de pensar que, ainda hoje, apesar das assimetrias e desigualdades do capitalismo, podemos aprender a nos organizar de um jeito diferente e reaprender a conviver. A convivência é o ponto central da política em um sentido muito antigo, do qual já falava Sócrates. Como todos os atores, tão diferentes, podem conseguir a felicidade e a plenitude no meio de todos, no espaço restrito da pólis? A ideia de democracia que está por trás do seminário é mais profunda que uma noção de igualdade: é a ideia de que somos todos diferentes.

Agência FAPESP – Qual o efeito desse contexto dominado pelo individualismo sobre o desenvolvimento tecnológico e científico?
Molina – Vamos tentar falar do conjunto ciência e tecnologia: a tecnociência. Se as pessoas acreditam que o investimento em ciência e tecnologia leva o país a crescer automaticamente, melhorando a vida da população, temos o determinismo tecnológico. Nesse caso, já que o resultado seria necessariamente bom para todos, o investimento poderia ser feito sem preocupação com a participação da coletividade – esse determinismo tecnológico é favorecido em um contexto individualista.

Agência FAPESP – Então, sem a participação da coletividade nas decisões científicas e tecnológicas, os avanços do conhecimento não chegam a beneficiar a sociedade?
Molina – Acho que é por isso que temos que combater o determinismo tecnológico. Com essa lógica, o investimento não volta diretamente para a população, mas para as corporações. Os investimentos públicos formam técnicos, especialistas e recursos humanos para a universidade e para o sistema tecnológico. Mas essas pessoas poderão desenvolver tecnologias que melhorem as corporações, não necessariamente o país. Se nossa sociedade tem base tecnológica e capitalista, mesmo que se possa desenvolver a melhor tecnologia, ela irá se limitar a desenvolver a tecnologia com melhor custo-benefício. Tudo o que está envolvido com essas tecnologias será avaliado do ponto de vista quantitativo, porque estará orientado pela produtividade. Incluindo as relações com trabalhadores.

Agência FAPESP – Esse tipo de modelo tecnológico tenderia a agravar o quadro de exclusão social?
Molina – Acredito que sim. A tecnologia orientada pela produtividade só é acessível a quem tem determinado poder de consumo. As distâncias sociais que deveriam ser diminuídas por conta da tecnologia começam a aumentar. O crescimento das diferenças sociais agrava a violência. No fim, a tecnologia, que poderia ter um papel de inclusão, acaba fazendo o contrário.

Agência FAPESP – As tecnologias sociais seriam um possível caminho para contornar esses problemas?
Molina – O Brasil tem uma rede muito boa de tecnologia social. Ela tem 700 organizações – a maioria organizações não-governamentais –, sendo 400 muito ativas. Todas pensam em confrontar essa idéia da tecnologia capitalista associada à corporação. Nesse modelo fundamentado na produtividade, não se pode acessar o conhecimento – que deve ser patenteado. O usuário não é dono do meio onde essa tecnologia vai se produzir e não se pode decidir para onde vai o benefício do desenvolvimento.

Agência FAPESP – Essas tecnologias teriam então mais legitimidade?
Molina – As tecnologias sociais têm um papel importante na democratização do conhecimento, mas elas não chegam a garantir a legitimidade da forma como a entendemos. É preciso distingui-la da eficácia. A tecnociência tem eficácia, mas não tem legitimidade social. Esses dois conceitos muitas vezes são confundidos no próprio discurso do desenvolvimento tecnológico, que está baseado na ideia de controle. O que é o controle? Uma coisa é poder controlar a matéria ou a partícula – como pode a nanotecnologia – no espaço e no tempo. Esse é o controle científico, que é necessário e desejável. Mas não suficiente. Outra coisa é poder dar legitimidade a esse controle.

Agência FAPESP – E como dar mais legitimidade ao controle das práticas científicas?
Molina – Para mim, a legitimidade não está no conteúdo das decisões sobre os rumos tecnológicos, mas no jeito como essas decisões são tomadas. Se a decisão foi tomada de maneira coletiva e democrática e daí gerou os rumos e decisões, isso a legitima, não pelo conteúdo, mas pela forma coletiva. O que temos que pensar é quais são os atores em cada âmbito que deveriam participar democraticamente, sendo reconhecidos como diferentes e igualmente importantes, do rumo mais democrático da enorme capacidade tecnológica que já temos. Mas se não conseguimos dar a isso um caráter democrático, então o rumo será tecnocrático e corporativo. A responsabilidade é nossa. A palavra-chave é participação.

Agência FAPESP – Há propostas para melhorar essa participação?
Molina – O controle tecnológico, voltado para o controle da matéria no espaço e no tempo, não tem, em si, nenhuma legitimidade. Propomos dois novos eixos para pensar essa legitimidade: o tempo da educação e o espaço da participação política. Para melhorar essa participação, temos que gerar um espaço de protagonismo social em que os outros atores possam interagir com os cientistas. O especialista tem uma função consultiva importante, um compromisso de indicar as possibilidades, mas não a prerrogativa de ditar os rumos. Com a ajuda dele, o leigo poderia ter a possibilidade democrática de decidir o futuro. Mas isso não acontece. Na nossa organização estamos excluídos de todas as decisões tecnológicas. Não temos o espaço da participação política.

Agência FAPESP – E quanto ao tempo da educação?
Molina – Levamos tempo para educar alguém a ser crítico com a tecnologia e a conhecer sua própria capacidade de decisão e sua autonomia de criatividade. Essa é a dimensão do tempo da educação. Temos que introduzir essa discussão na escola inicial, porque ali as crianças já têm celular, videogames e muitas possibilidades tecnológicas. Seria importante começar a combater cedo a idéia introjetada de que a ciência é apolítica. Ao superar as idéias de neutralidade e determinismo do desenvolvimento tecnocientífico, só nos restará a possibilidade de um desenvolvimento político, democrático, com participação cidadã. Mas esse cidadão crítico ainda não existe, daí a importância dessa dimensão da educação.

Agência FAPESP – Ainda estamos muito distantes da formação desse cidadão crítico?
Molina – Talvez nem tanto. Podemos pensar no que aconteceu com a cultura ecológica. As crianças e as novas gerações já colocam o problema ecológico de forma mais prioritária. Isso ocorreu, entre outros fatores, porque a ecologia começou a ser apresentada às crianças de forma muito forte, desde a escola inicial. Acho que poderia acontecer o mesmo com o problema tecnológico. Para isso temos que começar a refletir com mais clareza sobre lixo tecnológico, obsolescência planejada, qualidade tecnológica, durabilidade, tecnologias para o futuro, tecnologias sustentáveis, tecnologias adequadas aos problemas – e não apenas ao consumo em massa – e tecnologias customizadas, que não impõem uma única solução, como se fôssemos todos iguais.

Fonte: Agência Fapesp, 16/01/2009.

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Academic Rank of Authors Publishing in Open Access Journals

Nowick, Elaine A. 2008. “Academic Rank of Authors Publishing in Open Access Journals.” Agricultural Information Worldwide, v. 1, no. 2, pp. 45-51.

When deciding where to publish their research results, faculty take into consideration factors such as the prestige and readership of journals. The weight a journal article will carry is particularly a concern for pre-tenured faculty members. Previous research has indicated that some faculty members may have some concerns about publishing in Open Access journals because of a perceived lack of rigor and reputation of Open Access titles. In this study, the academic rank of authors publishing in Open Access and commercial scholarly journals was compared. Most authors in both Open Access and for-fee journals were full professors. There was no indication that pre-tenured faculty avoided Open Access titles. In fact, there was a slight but significant trend for pre-tenured faculty to publish in Open Access journals.

References

Annual Report on the Economic Status of the Profession: Selected tables; AAUP Academe; 2007, p46, 1p.

Number of Full-Time Faculty Members by Sex, Rank, and Racial and Ethnic Group, Fall 2005; Almanac of Higher Education, 2007-8 Chronicle of Higher Education; 2007 Vol. 54 Issue 1, p24, 1p.

Publishing online-only peer-reviewed biomedical literature: Three years of citation, author perception, and usage experience; Anderson, Kent; Sack, John; Krauss, Lisa; O'Keefe, Lori JEP: The Journal of Electronic Publishing; 2001 Vol. 6 Issue 3.

An examination of citation counts in a new scholarly communication environment; Bauer, Kathleen; Bakkalbasi, Nisa D-Lib Magazine; 2005 Vol. 11 Issue 9.

Open access to scientific publications -- an analysis of the barriers to change?; Bjork, Bo-Christer Information Research; 2004 Vol. 9 Issue 2.

Open Access & Science Publishing -- Results of a Study on Researchers' Acceptance and Use of Open Access Publishing; Hess, Thomas; Wigand, Rolf T.; Mann, Florian; von Walter, Benedikt Management Reports of the Institute for Information Systems and New Media; 2007, Munich : LMU Munich.

Lotka's law, Price's urn, and electronic publishing. Koenig, Michael; Harrell, Toni Journal of the American Society for Information Science; 1995 Vol. 46 Issue 5, p386-388,

Electronic journals in business schools: Legitimacy, acceptance, and use; Palmer, Jonathan; Speier, Cheri; Wren, Daniel; Hahn, Susan Journal of the Association for Information Science; 2000 Vol. 1 Issue 2, p1-31, 31p.

Electronic publishing of professional articles: Attitudes of academics and implications for the scholarly communication industry; Schauder, D. Journal of the American Society for Information Science; 1994 Vol. 45 Issue 2, p73-100, 28p.

Tenure and Promotion: Should you publish in electronic journals?; Sweeney, Aldrin E. Journal of Electronic Publishing; 2000 Vol. 6 Issue 2.

Academics; Tomney, Hilary; Burton, Paul F. Journal of Information Science; 1998 Vol. 24 Issue 6, p419-429, 11p.
Ulrich's Periodicals Directory; 2008, New Providence, NJ : Bowker.

DOAJ -- Directory of Open Access Journals

Note: Article Not Yet Deposited In Institutional Repository [01-07-09]

[http://www.unl.edu/libr/liaison/facultysites/nowickElaine/]

Fonte: Scholarship 2.0: An Idea Whose Time Has Come.

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América Latina: A ciência cresce, apesar da crise

Artigo de Nora Bär

Aumenta o número de cientistas, de publicações e de pedidos de patentes, mas é preciso mais investimento privado.

Nora Bär é editora de Ciência e Saúde do jornal La Nacion, Argentina:

Aunque la "crisis" amenace la economía mundial, el año que acaba de cerrarse arroja un balance positivo para la ciencia local y del resto de América latina. Con todos los indicadores en crecimiento (inversión, recursos humanos, publicaciones, patentes), se consolida un período de expansión de alrededor de seis años que, según los especialistas, debería continuar.

Tales son las conclusiones que surgen de la precisa radiografía que traza “El estado de la ciencia”, informe elaborado anualmente por la Red Iberoamericana de Indicadores de Ciencia y Tecnología (Ricyt), del Programa de Ciencia y Tecnología para el Desarrollo, y el Observatorio Iberoamericano de Ciencia, Tecnología e Innovación, perteneciente al Centro de Altos Estudios Universitarios de la Organización de Estados Iberoamericanos para la Educación, la Ciencia y la Cultura.

"Hay muchos motivos para ser optimistas -dice el doctor Mario Albornoz, coordinador de la Ricyt y director del Centro Argentino de Información Científica y Tecnológica del Conicet-. El carro se ha puesto en marcha. Exitos tenemos muchos. El asunto es lograr que esos casos excepcionales de cualquiera de nuestros países se conviertan en la regla."

Para Albornoz, aunque la inversión en ciencia crece en forma despareja, otros indicadores -como el aumento de recursos humanos dedicados a actividades científico-tecnológicas, o el de publicaciones en revistas de primer nivel internacional- dejan entrever un panorama alentador.

"El único país que supera una inversión del 1% del PBI en ciencia es Brasil -comenta-. El resto está lejos de ese nivel [la Argentina llega al 0,49%]. Pero aunque hubo un crecimiento leve en la inversión, hubo uno importantísimo en calidad. América latina es la región que más crece en publicaciones en todas las bases de datos, y no sólo en el Science Citation Index(SCI)."

Aunque no con el ímpetu de Brasil, la producción científica local medida por las publicaciones en revistas internacionales también creció vigorosamente: en la última década pasó de 4262 a 5935 en el SCI; de 1994 a 2669, en la base Pascal, y de 658 a 1426, en Compendex, por citar sólo algunas.

"Después de los años «malos», principalmente como consecuencia de la crisis de 2001, los científicos encontraron un clima que les permitió trabajar tranquilos y recuperar el entusiasmo", dice Albornoz.

Otro dato positivo es el retorno de investigadores, que ya superan los 600, "un número nada despreciable", según el especialista.

"Tal vez no tenga la envergadura que podría tener, pero lo cierto es que antes se nos iban -reflexiona-. Es algo que no se puede pasar por alto. Y menos aún si se tiene en cuenta que la tendencia es creciente. Todo indica que este año serán más aún."

Otra de las noticias auspiciosas que deja 2008 es el excelente momento por el que está pasando el Conicet, que está consolidándose y continúa creciendo a razón de más de 2000 investigadores por año.

"Y lo ha hecho sin tensiones ni conflictos -subraya Albornoz-. Hay quienes observan que el aumento en el número de becas [para el ingreso a la carrera de investigador] que se conceden hace que baje el tradicional nivel de excelencia. Pero los brasileños también dieron becas para doctorados masivamente, y aunque luego muchos fueron fracasos académicos, el crecimiento está a la vista? Por otro lado, es tan bueno que pueda haber una salida académica para que los pibes no tengan que irse afuera..."

Un capítulo novedoso en la actividad científico-tecnológica de la región es el del patentamiento. El número de patentes es uno de los indicadores utilizados para medir los resultados de los sistemas de innovación y desarrollo, pero como tradicionalmente la investigación en América latina se hacía en ámbitos académicos no había tradición de patentamiento. En el país, el Conicet es la institución, entre las públicas y las privadas, que más número de patentes solicitó.

"Las propias universidades tomaron conciencia de que tienen que alentar el patentamiento, y ahora hay incluso argentinos que están patentando en los grandes mercados, lo que significa que tienen esperanzas de que sus desarrollos sean competitivos en el plano internacional", explica Albornoz.

Dentro de este panorama estimulante, subsiste lamentablemente un dato negativo: "El drama, sobre todo en nuestro país, es la falta de inversión privada. Brasil encontró una manera de estimularla a través de las concesiones de explotación de servicios públicos. En la Argentina estamos atrasados, igual que el resto de América latina. Y eso no es culpa del sistema científico, sino consecuencia del tipo de estructura económica de nuestros países. Tiene más herramientas para corregirlo el ministro de Economía que el de Ciencia", afirma el especialista.

Sin embargo, enseguida concluye: "Los engranajes se han puesto en marcha y hacen prever que [este proceso de crecimiento] no va a decaer, porque hay optimismo, hay gente de calidad trabajando y hay apoyo institucional. Si además mejora el financiamiento, creo que puede haber un salto interesante".
(La Nacion, 2/1)

Fonte: JC e-mail 3673, de 05 de Janeiro de 2009.

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