07 agosto 2008

O OBSERVATÓRIO DA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE CONVIDA:

Ciclo de Debates Estratégias de Inovação

No último dia 25 de abril, os resultados gerais da pesquisa “Estratégias de inovação em sete países: EUA, Canadá, França, Irlanda, Finlândia, Reino Unido e Japão”, patrocinada pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), foram apresentados em evento realizado no IEA/USP.

Devido à boa receptividade e grande repercussão que o estudo obteve, o Observatório da Inovação e Competitividade do Instituto de Estudos Avançados da USP vai promover um ciclo de debates em que as discussões sobre as principais estratégias de inovação serão sistematizadas por país.

Serão ao todo quatro sessões que abordarão as experiências norte-americana, francesa, finlandesa e japonesa. As apresentações ficarão a cargo dos pesquisadores do Observatório. Para os debates foram convidados representantes das respectivas embaixadas. O evento conta com o apoio institucional do Woodrow Wilson International Center for Scholars.

Programação
11 de agosto 2008, das 10h00 às 12h00
Estratégias de Inovação nos Estados Unidos
Coordenação: Glauco Arbix
Palestrantes: Paulo Todescan Lessa Mattos, FGV/RJ e Cebrap; Alexandre Abdal, Cebrap; representante da ABDI; representante da embaixada dos Estados Unidos

18 de agosto de 2008, das 10h00 às 12h00
Estratégias de Inovação na França
Coordenação: Glauco Arbix
Palestrantes: Mario Sergio Salerno, POLI/USP e Coordenador Executivo do Observatório da Inovação e Competitividade; Laura Parente, Latts/França; representante da ABDI; representante da embaixada da França

25 de agosto de 2008 , das 10h00 às 12h00
Estratégia de Inovação na Finlândia
Coordenação: Mario Sergio Salerno
Palestrantes: Glauco Arbix, FFLCH/USP e Coordenador Geral do Observatório da Inovação e Competitividade; Joana Ferraz, FGV/SP; representante da ABDI; Pekka Hirvonen, Segundo Secretário da embaixada da Finlândia

01 de setembro de 2008, das 10h00 às 12h00
Estratégia de Inovação no Japão
Coordenação: Glauco Arbix
Palestrantes: Mario Sergio Salerno, POLI/USP e Coordenador Executivo do Observatório da Inovação e Competitividade; Zil Miranda, Cebrap; representante da ABDI; representante da embaixada do Japão

Todas as sessões serão realizadas no Auditório Alberto Carvalho da Silva do IEA/USP – Av. Prof. Luciano Gualberto, Trav. J, 374, Cidade Universitária, Butantã, São Paulo, SP.
Haverá transmissão ao vivo pela web em www.iea.usp.br/aovivo.
Inscrição por sessão de interesse, somente por email em ineshita@usp.br, sem custo e sem certificação.
Vagas Limitadas.

Marcadores:

Especiais

Teoria e aplicação

7/8/2008

Por Fábio Reynol, de Campinas (SP)


Agência FAPESP – Muitas vezes encarada como uma grande área do conhecimento “pouco científica”, as ciências sociais têm muito a contribuir para o desenvolvimento científico no Brasil e no mundo, tanto por suas construções teóricas como por suas aplicações práticas.

Essa foi a tônica de uma mesa-redonda que reuniu especialistas no assunto no 6º Encontro da Sociedade Brasileira de Ciência Política, realizado na semana passada na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Simon Schwartzman, presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (IELTS), abriu o debate apresentando uma pesquisa realizada em quatro países, entre eles o Brasil. Foi um levantamento entre grupos de pesquisa em ciências sociais sobre a possibilidade de combinar pesquisa acadêmica de qualidade com pesquisa aplicada relevante do ponto de vista social. A resposta foi negativa na maior parte dos casos.

Para Schwartzman a ciência pura não resulta necessariamente em ganhos práticos para a sociedade. “É freqüente que se invista na pesquisa acadêmica esperando que ela um dia vá gerar resultado prático, mas isso traz dificuldades”, afirmou.

Entre os fatores responsáveis pela falta de efeitos práticos de muitas pesquisas, Schwartzman apontou o sistema de avaliação da produção científica que, para ele, apesar de importante, precisa ser revisto. “Como a avaliação dá ênfase à abordagem acadêmica, acabamos deixando a desejar no lado da aplicação prática”, disse.

Para ele, o modelo de avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), por exemplo, deve ser repensado, uma vez que “o imenso crescimento da produção científica brasileira não tem se traduzido em benefício para a sociedade”.

Um dos problemas com o modelo de avaliação da Capes, segundo Schwartzman, é que ele está associado às ciências “mais puras”, como química ou física, e “há distorções quando é aplicado às ciências humanas”.

Outro ponto a ser revisto, segundo ele, é o fato de o modelo em vigor não conseguir abranger a multidisciplinaridade vigente na pesquisa científica atual. “Não podemos usar uma camisa-de-força para abarcar tudo o que temos hoje”, destacou.

Realidade mais complexa

Rubem George Oliven, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), chamou a atenção para o aumento da complexidade do mundo contemporâneo, o que torna o trabalho das ciências sociais muito mais difícil.

“Há algumas décadas os cursos de ciências sociais conseguiam dar conta da realidade. Hoje isso não é mais possível, porque a realidade ficou bem mais complexa”, disse o também professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Oliven apontou uma internacionalização da pesquisa brasileira em ciências sociais. África, países vizinhos e até o distante Timor Leste, na Oceania, já são alvos dos cientistas sociais brasileiros. Mas apontou uma barreira para a internacionalização da pesquisa brasileira em ciências humanas: a língua.

Se, por um lado, a maioria dos cientistas sociais brasileiros escreve em português, limitando a disseminação de seu trabalho pelo mundo, de outro, escrever em inglês poderia afetar o estilo próprio, o que é muito mais determinante nas ciências sociais do que nas outras. “Um artigo de física ou química é muito diferente de um de sociologia. Poderíamos perder o nosso estilo ao escrever em inglês”, disse.

Wrana Maria Panizzi, vice-presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), concordou com a queixa dos pesquisadores presentes em relação aos poucos recursos para a área. “Os recursos para as ciências sociais são realmente menores, mas crescentes”, disse.

Panizzi apresentou os projetos e visões da entidade e revelou pontos que considera importantes para o desenvolvimento do país e que dependem do trabalho do cientista social, como as novas relações de trabalho, o problema da educação, a violência, as novas estruturas rurais, as organizações sociais, a emancipação feminina e a inclusão social.


Missão da universidade

Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, salientou que o modelo da universidade pública é muitas vezes visto com um certo “utilitarismo tecnológico” com duas vertentes básicas: uma de direita, que defende o papel das universidades como geradoras de inovação para as empresas; e outra de esquerda, que vê a instituição pública como geradora de conhecimento para redução da pobreza.

“Não devemos perder de vista que o grande impacto que uma universidade tem em uma sociedade não vem das descobertas científicas feitas lá, mas dos estudantes que são educados na instituição”, afirmou.

Brito Cruz criticou um ranking de universidades chinesas que contabiliza números de artigos, prêmios recebidos, impactos das pesquisas, mas não cita quantos alunos são formados por aquelas instituições. Para ele, as instituições de pesquisa governamentais com missão dirigida, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária e o Instituto Agronômico de Campinas, por exemplo, são os locais mais privilegiados para o desenvolvimento da pesquisa aplicada.

“A missão das universidades é a educação com apoio da pesquisa. Claro que é importante que essa pesquisa tenha aplicações quando puder, mas não podemos avaliar a universidade pelas descobertas que ela vai gerar”, afirmou.

Brito Cruz apontou três relevâncias da ciência moderna que são importantes para a sociedade e chamou a atenção para a última. “A ciência, por meio de suas descobertas, pode deixar o cidadão mais rico. Ela também pode deixar o cidadão mais saudável. Mas a terceira relevância, mais significativa e freqüentemente esquecida, é fazer o ser humano ficar mais sábio”, disse.

Fonte: Agência FAPESP, 07/08/2008.

Marcadores:

04 agosto 2008

Especiais
Vácuo de conhecimento

31/7/2008

Fábio Reynol, de Campinas

Agência FAPESP – A cada ano, cerca de 130 mil pessoas perdem a vida no Brasil por causa dos mais diversos tipos de violência. Foi com esse dado que o sociólogo Gláucio Soares abriu sua palestra no 6º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política, nesta quarta-feira (30/7), na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O pesquisador, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), atribuiu as responsabilidades pelo problema não somente ao poder público, mas também ao cidadão e até à comunidade acadêmica. Segundo ele, o conhecimento científico tem um impacto importante na redução dos índices de violência.

Soares criticou a falta de estudos ligados ao tema e relacionados ao Brasil ou à América do Sul. “Se fizermos um levantamento nos trabalhos de mestrado e doutorado em ciências políticas em todo o país, teremos a impressão de que alguns países não existem”, disse o pesquisador. Paraguai, Peru, países da América Central, nações africanas –, com exceção da África do Sul –, e regiões do próprio Brasil são algumas das omissões que destacou na produção acadêmica nacional.

“Alagoas, por exemplo, é um dos estados mais violentos e simplesmente não sabemos o que está acontecendo lá”, disse. O preço dessa omissão, segundo ele, é maior do que as vidas tiradas anualmente, pois ainda é preciso considerar os feridos e as demais seqüelas deixadas pela violência.

No entanto, para Soares, não adianta ter dados se não houver ações de governo. Para ele, as políticas públicas são “fios invisíveis”, uma vez que sua percepção por parte da sociedade é sutil, embora façam muita diferença.

Segundo o sociólogo, essas políticas envelhecem e precisam ser renovadas. Como exemplo do processo de obsolescência mencionou o código de trânsito brasileiro de 1961, que reduziu constantemente os acidentes fatais até o fim da década de 1970, quando o número de ocorrências se estabilizou.

“Quando um novo código de trânsito foi adotado, em 1997, o número de mortes caiu dramaticamente, mais uma vez. Foram mais de 4 mil vidas salvas somente no primeiro ano de implantação”, afirmou.


Ação acadêmica

Como exemplo de colaboração acadêmica e cidadã contra a violência, Soares citou um trabalho que coordenou na Universidade de Brasília (UnB) na década de 1990, quando seis alunos se voluntariaram para levantar dados a respeito das mortes no transporte público na capital federal. Ao sair em campo, os estudantes constataram que a maioria dos acidentes se dava nos ônibus no momento em que o passageiro desembarcava do veículo.

A solução proposta foi a adoção de um equipamento mecânico que impedia que o motorista movimentasse o veículo com a porta aberta. Entretanto, somente as empresas públicas de transporte adotaram a tecnologia, fazendo o número de fatalidades entre eles cair a zero. Nas companhias privadas, as mortes continuaram.

“Essas empresas, que são licenciadas pelo poder público, não se moveram pelo interesse da sociedade”, apontou Soares, colocando a responsabilidade pela violência também sobre a iniciativa privada.

A recém-criada “lei seca” nacional, que pune os motoristas flagrados embriagados, também foi mencionada como exemplo de medida respaldada em fatos científicos.

“O álcool está diretamente associado à questão da violência doméstica, do trânsito e aos homicídios”, afirmou o pesquisador citando exemplos das cidades de Bogotá, na Colômbia, e Diadema, na Grande São Paulo. Ambas tinham índices de violência alarmantes e adotaram medidas de restrição ao álcool, como a lei apelidada de “fecha-bar” na cidade paulista.

Adotada em 2001, a lei que proíbe o funcionamento de bares após as 23 horas ajudou a tirar Diadema dos primeiros lugares no ranking das cidades mais violentas do Brasil, resultando em uma redução de 68% da taxa de homicídios no município.

Bogotá, por sua vez, foi governada por rivais políticos que se revezaram no poder, mas que mantiveram as políticas de sucesso dos antecessores. “Foram políticas de Estado e não de governo, por isso deram certo”, disse o pesquisador.

Fonte: Agência FAPESP, 31/07/2008.
Entrevistas
Inovação desprotegida
25/6/2008

Por Fábio de Castro



Agência FAPESP – Consultor internacional e pesquisador da área de transferência e comercialização de tecnologia, Robert Sherwood dedicou as últimas duas décadas à investigação do papel da propriedade intelectual em países em desenvolvimento.

Na última terça-feira (24/6), o norte-americano, um dos especialistas internacionais consultados para a elaboração da Lei de Inovação brasileira, apresentou, na sede da FAPESP, a palestra Successful commercialization of university and government-sourced technology: pitfalls and opportunities ("Comercialização bem-sucedida de tecnologia apoiada por governo e universidade: armadilhas e oportunidades").

Em entrevista à Agência FAPESP, o consultor afirmou que a ciência produzida no Brasil tem alta qualidade, mas não resulta em produtos comerciais com freqüência por não atrair investidores privados globais. E o que afasta esses investimentos é a fragilidade do sistema brasileiro de propriedade intelectual.

Sherwood, que estudou no Harvard College, na Escola de Direito da Universidade Harvard e na Universidade Colúmbia, atuou na área de direito internacional e conduziu um diagnóstico de sistemas de propriedade intelectual na América Latina para o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

A experiência levou à criação de um modelo numérico de análise que permite avaliar sistemas de propriedade intelectual nacionais a partir da perspectiva de investidores privados. A abordagem foi aplicada a 18 países em desenvolvimento. Sherwood diz ter feito mais de 150 visitas ao Brasil desde 1972. Atualmente, visita o país três vezes ao ano.


Agência FAPESP – Por que o Brasil tem tanta dificuldade para transformar produção científica em inovações inseridas no mercado?
Robert Sherwood – O governo brasileiro investe recursos imensos em pesquisa, o que garante uma ciência de nível internacional. Mas o investimento privado global, necessário para transformar essa produção científica e tecnológica em produtos, não chega ao país. Os investidores globais relutam em colocar dinheiro no Brasil

Agência FAPESP – Qual é a causa dessa relutância?
Sherwood – Eles conhecem os altos riscos do investimento em inovação e, por isso, não querem colocar recursos em países com um sistema de propriedade intelectual fraco, como é o caso do Brasil. Esses investimentos acabam indo para os Estados Unidos.

Agência FAPESP – Poderia citar alguns dos pontos fracos do sistema brasileiro de propriedade intelectual?
Sherwood – Sem dúvida seria preciso fazer pelo menos alguns ajustes técnicos na Lei de Inovação. Não tenho certeza de qual seria o momento ideal para esses ajustes, mas a lei ainda tem um caráter experimental, dando mais importância à inovação com investimentos estatais do que ao fomento por meio de investimento privado. A exigência de edital para o licenciamento exclusivo de tecnologias desenvolvidas com financiamento do governo também é um ponto a ser revisto. Uma das necessidades mais importantes é uma ampla reestruturação do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). A Lei da Propriedade Industrial também tem artigos confusos.

Agência FAPESP – Como esses problemas afetam a comercialização de tecnologias? Poderia exemplificar?
Sherwood – Algumas das empresas start up, particularmente na área biológica e de saúde, estão lidando com problemas de propriedade intelectual. Digamos que uma empresa brasileira tente fazer avançar uma tecnologia original, proveniente do conhecimento produzido na universidade. É provável – a não ser que se trate de uma tecnologia muito simples – que sua capacidade para comercializar, que passa pelo desenvolvimento do produto ou do processo, exija o acesso a uma outra tecnologia estrangeira. Haverá situações em que o fornecedor dessa tecnologia intermediária se recusará a disponibilizá-la no Brasil, porque ela não será adequadamente protegida aqui. O desenvolvimento das tecnologias por empresas brasileiras será então retardado. Isso é parte dos efeitos invisíveis da fraqueza do sistema de proteção intelectual no Brasil.

Agência FAPESP – Além dos problemas da legislação, pode-se dizer que há obstáculos culturais? O cientista pensa pouco em inovação?
Sherwood – Acho que é muito importante que mais universidades se aproximem da comercialização de tecnologias. Seria fundamental que elas pensassem seus processos de uma maneira nova, entendendo a importância da propriedade intelectual para apoiar a comercialização. Assim elas estariam em posição de agir quando os políticos finalmente se voltarem para os problemas da propriedade intelectual. Em outras palavras, aqueles que estão fazendo invenções no Brasil precisam experimentar um pouco mais o processo de mudar para uma comercialização de sucesso em escala global.

Agência FAPESP – A pesquisa deveria ser mais voltada para o mercado?
Sherwood – Não se trata de ciência voltada exclusivamente para o mercado, mas seria preciso que o cientista tivesse a questão da propriedade intelectual em mente desde o começo de uma pesquisa. Ele poderia, antes de mais nada, verificar nos bancos de patentes internacionais se sua tecnologia não foi patenteada – o que destruiria o possível interesse de investidores. Os cientistas também deveriam ter contato mais próximo com quem entende de propriedade intelectual, para ter em mente que produtos podem ser protegidos. Outro ponto fundamental seria depositar o pedido de patente antes de publicar o artigo científico.

Agência FAPESP – Não há uma tensão entre a necessidade de publicar, para ter credibilidade e conseguir recursos, e a necessidade de proteger as descobertas?
Sherwood – Ambos são importantes. O cientista brasileiro publica muito e isso é importante para fazer avançar o conhecimento. Isso precisa continuar. Mas é preciso buscar patentes e olhar para onde estão os potenciais comerciais, em vez de desperdiçar essas possibilidades. É uma questão de ter certeza de que os pedidos de patente estão terminados antes que o artigo seja publicado. Não vejo incompatibilidade entre publicar e patentear. Assim como não vejo contradição entre ciência básica e ciência aplicada. Mesmo tendo o potencial de mercado em vista, o pesquisador pode fazer descobertas científicas de alta importância.

Agência FAPESP – Quanto o Brasil poderia melhorar seu desempenho de produção tecnológica com uma melhora do sistema de proteção intelectual?
Sherwood – Há muito tempo especialistas em todo o mundo ficam perplexos com o contraste entre a altíssima qualidade da ciência feita no Brasil e a pouca energia que essa produção tão boa coloca na base industrial do país. O potencial é realmente impressionante. E não é preciso muito para consertar essa fraqueza. O custo não é grande. Ao contrário, se o sistema de propriedade intelectual fosse forte o suficiente para trazer investimentos privados, substituindo os investimentos que o governo é forçado a fazer, haveria muito mais recursos públicos para outras partes da economia. Em vez de tentar impulsionar a inovação, esse dinheiro poderia ser remanejado para o sistema de saúde e educação.

Agência FAPESP – O senhor afirmou que a propriedade da patente é uma questão ilusória, que o mais importante é saber quem tem o poder de negociar o licenciamento. Poderia explicar esse ponto de vista?
Sherwood – A propriedade da patente não é de fato a questão crítica. O mais importante é a habilidade para negociar direitos para usar a patente com o investimento privado. Não importa quem seja o dono da patente é preciso eleger alguém que tenha sabedoria, inteligência e que seja uma pessoa de negócios para formular um arranjo no qual o dinheiro vai ser distribuído entre a fonte de recursos original do governo, a universidade, o departamento e o professor ou a equipe que fez o trabalho que gerou joint ventures de pesquisa.

Agência FAPESP – Poderia exemplificar?
Sherwood – Vamos dizer que há uma equipe de Israel em parceria com uma equipe da USP e elas fazem uma importante comercialização de uma nova tecnologia. Temos que ter certeza sobre como vamos distribuir os ganhos dessa comercialização, entre os israelenses e a USP. Geralmente são determinações muito complexas, mas não esperem para definir isso depois de o produto entrar no mercado, ou haverá briga. Desde o início do processo é preciso saber quem vai ficar com dinheiro. E, não importando a quem pertença a patente, será possível nomear alguém que faça a negociação com sabedoria.

Agência FAPESP – Qual a sua opinião sobre as incubadoras de empresas brasileiras? Elas estão conseguindo transferir tecnologia?
Sherwood – O movimento de incubadoras no Brasil tem um crescimento impressionante. A maior parte das universidades hoje têm incubadoras, mas a maioria delas foi criada sem nenhuma preocupação com propriedade intelectual. Poucas das que conheci compreenderam a importância da questão. A de Curitiba, por exemplo, exige que as pequenas empresas ingressantes mostrem sua capacidade de proteção intelectual. Creio que eles têm uma taxa de sucesso maior com suas empresas graduadas. Outras fazem um grande trabalho, mas não têm uma apreciação adequada para propriedade intelectual. Eu soube, por exemplo, de visitas de delegações chinesas a incubadoras brasileiras sem imposição de sigilo. Os chineses tiraram fotos e pediram cópias de diagramas. É um tipo suave de espionagem. Tecnologias brasileiras estariam beneficiando a indústria de base chinesa. Não tenho provas disso, mas é um temor justificável.


Fonte: Agência FAPESP, 25/06/2008.

Marcadores: